quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O Inútil Luar



É noite. A Lua, ardente e terna, 
Verte na solidão sombria 
A sua imensa, a sua eterna melancolia . . . 
Dormem as sombras na alameda 
Ao longo do ermo Piabanha. 
E dele um ruído vem de seda Que se amarfanha . . . 
No largo, sob os jambolanos, 
Procuro a sombra embalsamada. 
(Noite, consolo dos humanos! Sombra sagrada!) 
Um velho senta-se ao meu lado. Medita. 
Há no seu rosto uma ânsia . . . 
Talvez se lembre aqui, coitado! 
De sua infância. Ei-lo que saca de um papel . . . 
Dobra-o direito, ajusta as pontas, 
E pensativo, a olhar o anel, Faz umas contas . . . 
Com outro moço que se cala, 
Fala um de compleição raquítica. 
Presto atenção ao que ele fala: 
— É de política. Adiante uma senhora magra, 
Em ampla charpa que a modela, 
Lembra uma estátua de Tanagra. 
E, junto dela, 
Outra a entretém, a conversar: 
— "Mamãe não avisou se vinha. 
Se ela vier, mando matar uma galinha." 
E embalde a Lua, ardente e terna, 
Verte na solidão sombria A sua imensa, a sua eterna Melancolia . . . 


Manuel Bandeira

Nenhum comentário:

Postar um comentário